Gulas@VISTAS

Rui Silvestre é uma espécie de Indiana Jones do experimentalismo culinário. O Indiana Jones caça tesouros para os manter nas mãos dos bons da fita. O Rui Silvestre caça sabores e combinações para os manter nas mãos da boa gastronomia portuguesa. Parece tão simples...
Estiveram à prova os dois menus de degustação disponíveis: Fauna e Flora,  inspirado na Natureza (€175) e Passeio Marítimo,  inspirado no Atlantico (idem). Foi também feito o pairing de vinhos no menu Fauna e Flora (€90). 
A GULA
É muito difícil eleger uma GULA que tenha catapultado a experiência para outro nível. Tudo surpreendente, uma narrativa consistente e cheia de história em toda a degustação, muita dela como resultado da dualidade de origens indianas e moçambicanas do chef e da riqueza gastronómica e marítima do Algarve. 
Mas consigo destacar o storytelling do prato de lagostim. O crustáceo foi cortado em 4 porções e colocados 4 molhos ao lado de cada porção: Doce, Amargo, Ácido e Picante. Objetivo: Perceber qual dos molhos potenciava mais o sabor do lagostim e, no final, molhar um Bao (pão tailandês) no conjunto do resto dos 4 molhos e sentir a soma de todos eles. 
Supostamente seria o mais perto do sabor umami possível. O 5o sabor. O conjunto de todos os outros 4 seria um intensificador da experiência. Senti uma explosão de sabor, é certo.  Mas se disso resultou um 5o sabor, só a minha paixão pela comida e a descoberta constante irá, com o tempo, levar--me a perceber do que se tratou.
A GULOSEIMA
As escolhas de vinhos e a interação do Sommelier Nuno Pires. Um apaixonado e curioso apreciador que tem tanto de genuíno como de bom conversador.
Apresentou castas únicas como Callum, regionais como Negra Mole e ainda nos brindou numa prova de sobremesa com o vencedor de melhor licoroso de 2021, um Nieport Vintage 2017 que conquistou o mundo com a elegância de um grande Porto Vintage.

Mostrou ainda Madeiras de 1875 com a reverência de quem mostra um diamante acabado de polir. Gostava de ter mais umas horas de mesa para percorrer toda as histórias que este escanção de mão cheia teria para contar. Que pairing!

O GULAG
Dizem que no melhor pano cai a nódoa mas neste caso o pano ficou imaculado. O que pode ter ensombrado a experiência escapa ao controle do restaurante. 

O serviço numa varanda com vista para o Green atrai forçosamente bicharada com asas que mergulhou no vinho e em alguns dos pratos. Mesmo com velas de citronela, a Natureza continuou a mostrar toda a sua oferta voadora. 

Outro dos fatores que complicam a experiência é a localização. Vila Nova de Cacela é para lá do Sol posto e o Hotel Monte Rei Golf & Country Club é para lá do para lá do Sol posto. É preciso querer muito e eu e a minha parelha passámos esse nível de intenção no gaming da boa gastronomia.

Rui Silvestre é um chef que surpreende num Algarve que cada vez mais torna estas boas surpresas difíceis de encontrar. Mas se procurarem bem vão perceber que há locais longe de tudo mas muito perto do coração. Especialmente para quem tem o coração na boca.

@gulasdosardinha

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